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Culto ao Sagrado Coração de Jesus

Atualizado: 16 de jun. de 2019

A palavra do Papa Bento XVI

A PALAVRA DO PAPA BENTO:


Carta do Papa Bento XVI no 50º aniversário da Encíclica «Haurietis aquas» do Papa Pio XII sobre o culto ao Coração de Jesus dirigida ao Superior Geral da Companhia de Jesus e Diretor Geral do Apostolado da Oração, Pe. Peter‑Hans Kolvenbach (15.05.2006).


As palavras do profeta Isaías – «Tirareis água com alegria das fontes da salvação» (Is 12,3) – que abrem a Encíclica com que Pio XII recordava o centenário da extensão a toda a Igreja da Festa do Sagrado Coração de Jesus – hoje, 50 anos depois, não perderam nada do seu significado. Na promoção do culto ao Coração de Jesus, a Encíclica Haurietis aquas exortava os fiéis a abrirem‑se ao mistério de Deus e do seu amor, deixando‑se transformar por Ele. À distância de 50 anos, cabe aos cristãos o compromisso sempre atual de continuar a aprofundar a sua relação com o Coração de Cristo, de modo a reavivar em si mesmos a fé no amor salvífico de Deus, acolhendo‑o sempre melhor na própria vida.


O lado trespassado do Redentor é a fonte à qual nos envia a Encíclica Haurietis aquas: devemos beber nesta fonte para alcançar o verdadeiro conhecimento de Jesus Cristo e experimentar mais a fundo o seu amor. Assim, poderemos compreender melhor o que significa conhecer o amor de Deus em Jesus Cristo, experimentá‑lo tendo o olhar fixo n’Ele até viver totalmente da experiência do seu amor, para depois poder testemunhá‑lo aos outros.


Na verdade, retomando uma expressão do meu venerando Predecessor João Paulo II, «junto ao Coração de Cristo, o coração humano aprende a conhecer o valor de uma vida autenticamente cristã, a livrar‑se de certas perversões do coração, a unir o amor filial para com Deus ao amor do próximo. Assim – e esta é a verdadeira reparação pedida pelo Coração do Salvador – sobre as ruínas acumuladas do ódio e da violência, poderá ser edificada a civilização do Coração de Cristo» (Insegnamenti, vol. IX/2, 1986, p. 843).


A - Conhecer o amor de Deus em Jesus Cristo

Na Encíclica Deus caritas est, citei a afirmação da primeira Carta de S. João: «Nós conhecemos e acreditamos no amor que Deus nos tem», para sublinhar que o encontro com uma Pessoa é a origem do ser cristãos (n. 1).


Dado que Deus se manifestou do modo mais profundo através da encarnação de seu Filho, tornando‑se «visível» n’Ele, é na relação com Cristo que podemos reconhecer quem é verdadeiramente Deus (cf. Enc. Haurietis aquas, 29‑41; Enc. Deus caritas est, 12‑15). E ainda: dado que o amor de Deus encontrou a sua expressão mais profunda no dom que Cristo fez da sua vida por nós na Cruz, é sobretudo na contemplação do seu sofrimento e morte que podemos reconhecer, de maneira sempre mais clara, o amor sem limites que Deus tem por nós: «Deus amou tanto o mundo, que lhe entregou o seu Filho Unigênito, a fim de que todo o que nele crê não se perca, mas tenha a vida eterna» (Jo 3,16).


Por outro lado, este mistério do amor de Deus por nós não é só o conteúdo do culto e da devoção ao Coração de Jesus: é igualmente o conteúdo de toda verdadeira espiritualidade e devoção cristã. Assim, é importante sublinhar que o fundamento desta devoção é tão antigo como o próprio cristianismo. De fato, ser cristão é somente possível com o olhar dirigido para a Cruz do nosso Redentor, «Aquele que trespassaram» (Jo 19,37; cf. Zc 12,10).


Com razão, a Encíclica Haurietis aquas (nº. 52) recorda que a ferida do peito e as dos cravos têm sido para incontáveis almas os sinais de um amor que alimentou a sua vida, sempre mais profundamente. Reconhecer o amor de Deus no Crucificado tornou‑se para essas almas uma experiência interior que as fez confessar, juntamente com Tomé: «Meu Senhor e meu Deus!» (Jo 20,28), permitindo‑lhes alcançar uma fé mais profunda no acolhimento sem reservas do amor de Deus (Haurietis aq. 49).


B - Experimentar o amor de Deus dirigindo o olhar ao Coração de Jesus Cristo

O significado mais profundo deste culto ao amor que Deus nos tem manifesta‑se somente quando se considera mais atentamente o seu contributo não apenas ao conhecimento, mas também e sobretudo à experiência pessoal de tal amor na entrega confiante ao seu serviço (Haurietis aquas, 62).


É claro que a experiência e o conhecimento não se podem separar: um faz referência ao outro. Importa também sublinhar que um autêntico conhecimento do amor de Deus somente é possível num clima de oração humilde e de generosa disponibilidade. Partindo desta atitude, o olhar dirigido ao lado do Senhor trespassado pela lança transforma‑se em silenciosa adoração.


O olhar para o peito trespassado do Senhor, do qual jorra «sangue e água» (Jo 19,37) ajuda‑nos a reconhecer a multidão dos dons de graça que daí provêm (Haurietis aquas, 34‑41) e abre‑nos a todas as outras formas de devoção cristã que estão incluídas no culto ao Coração de Jesus.


A fé, entendida como fruto da experiência do amor de Deus, é uma graça, um dom de Deus. Mas somente a pessoa humana poderá experimentar a fé como uma graça na medida em que a aceita dentro de si mesma como um dom, do qual procura viver. O culto do amor de Deus, ao qual a Encíclica Haurietis aquas (n. 72) convidava os fiéis, deve ajudar‑nos a recordar incessantemente que Ele tomou sobre si este sofrimento voluntariamente «por nós», «por mim».


Quando praticamos este culto, não só reconhecemos com gratidão o amor de Deus, mas continuamos a abrir‑nos a tal amor, de modo que a nossa vida seja sempre mais modelada por tal amor. Deus, que derramou o seu amor «nos nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado» (Rm 5,5), convida‑nos incansavelmente a acolher o seu amor.


O convite a entregar‑se totalmente ao amor salvífico de Cristo e a consagrar‑se a Ele (HA n. 4) tem, portanto, como primeira finalidade a relação com Deus. Eis porque este culto, totalmente dirigido ao amor de Deus, que se entrega em sacrifício por nós, é de tão insubstituível importância para a nossa fé e para a nossa vida no amor.


C - Viver e testemunhar o amor experimentado

Quem aceita o amor de Deus interiormente, é por ele configurado. O amor de Deus experimentado é vivido pela pessoa humana como uma «chamada» à qual ela deve responder. O olhar dirigido ao Senhor, que «assumiu as nossas enfermidades e carregou as nossas dores» (Mt 8,17), ajuda a tornar‑nos mais atentos aos sofrimentos e às necessidades dos outros.


A contemplação, em adoração, de Cristo com o lado trespassado pela lança torna‑nos sensíveis à vontade salvífica de Deus. Torna‑nos capazes de nos confiarmos ao seu amor salvífico e misericordioso; ao mesmo tempo, fortalece‑nos no desejo de participar na sua obra de salvação, como seus instrumentos.


Os dons recebidos do peito aberto do Salvador, do qual jorrou «sangue e água» (cf. Jo 19,34), fazem que a nossa vida se torne também para os outros fonte da qual correm «rios de água viva» (Jo 7,38) (Deus caritas est, 7). A experiência de amor recolhida do culto do lado trespassado do Redentor livra‑nos do perigo de nos fecharmos sobre nós mesmos, e torna‑nos mais disponíveis para uma vida ao serviço dos outros. «Nisto conhecemos o que é o amor: Ele, Jesus, deu a sua vida por nós; assim também nós devemos dar a vida pelos nossos irmãos» (1 Jo 3,16) (Haurietis aquas, 38).


A resposta ao mandamento do amor é possível somente através da experiência deste amor que nos foi já dado antes por Deus (Deus caritas est, 14). O culto do amor que se torna visível no mistério da Cruz, atualizado em cada celebração eucarística, constitui o fundamento para que possamos converter-nos em instrumentos nas mãos de Cristo (Haurietis aquas, 69): só assim podemos ser anunciadores críveis do seu amor.


Este abrir‑nos à vontade de Deus deve, porém, renovar‑se em cada momento: «O amor nunca está “concluído” e completado» (cf. Enc. Deus caritas est, 17). Olhar para o «lado transpassado pela lança», no qual brilha a vontade de salvação sem fronteiras da parte de Deus, não pode ser considerado como uma forma passageira de culto ou de devoção: a adoração do amor de Deus, que encontrou no símbolo do «coração trespassado» a sua expressão histórico‑devocional, permanece imprescindível para uma relação viva com Deus (Haurietis aquas, 62).


Com votos de que esta celebração cinqüentenária sirva para estimular em muitos corações uma resposta sempre mais fervorosa ao amor do Coração de Cristo, concedo‑lhe, Reverendíssimo Padre, e a todos os Religiosos da Companhia de Jesus, sempre muito ativos na promoção desta devoção fundamental, uma especial bênção apostólica.


Papa Bento XVI

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